Luca Venturini

 

Você já ouviu falar daquela regra de ouro que prega que, para se tornar um gênio em qualquer área da vida, é necessário treinar por 10.000 horas? Sim, esse foi um mito quase tão difundido quanto aquele de que só usamos 10% da nossa capacidade cerebral.

Daniel Goleman, autor do célebre livro “Inteligência Emocional”, lançado nos anos 1980, abordou a questão em sua mais nova obra “Foco: a atenção e seu papel fundamental para o sucesso”. De acordo com ele, a regra das 10.000 horas tem sido espalhada da maneira errada há muitos e muitos anos.

Não adianta você simplesmente se dedicar a alguma atividade – seja ela a escrita, o malabarismo ou o vôlei – e acalentar a esperança de tornar-se um gênio após dezenas de milhares de horas praticadas.

Um fator fundamental que é ignorado nessa equação é a variável “qualidade”, quase tão ou mais importante do que a quantidade de treino.

Pensa bem: um jogador de futebol que não sabe chutar com a perna esquerda, por exemplo, pode passar meses aprimorando esse atributo. Mas, se ele não receber a orientação correta em relação a detalhes como de qual forma posicionar o pé de apoio, como movimentar o quadril e qual parte do pé usar quando encostar na bola, o jogador vai passar todos esses meses “aperfeiçoando” a maneira errada com a qual ele já chutava de perna esquerda antes de começar a treinar.

Os ajustes finos são parte imprescindível do caminho de 10.000 horas que leva para se tornar um gênio.

Treino x Talento

E aqui cabe a discussão de um tópico irmão: o que é mais importante para o desenvolvimento de uma habilidade, o treino ou o talento natural (se é que existe algo do tipo)?

Para tratar dessa questão, vamos recorrer a outro estudioso do tema, o saudoso professor Pierluigi Piazzi, que lecionou Física durante décadas em cursos pré-vestibular, já foi vice-presidente da Mensa no Brasil (uma associação de indivíduos de alto QI) e que escreveu três livros dedicados ao tema do desenvolvimento da inteligência nos seres humanos.

O professor Pier, como sempre foi conhecido por seus alunos, era um defensor ferrenho da ideia de que inteligência, vocação e talento são atributos aprendidos, e não características fixas como a cor de nossos olhos. No seu livro “Estimulando Inteligência”, ele afirma que muitas vezes observamos uma criança com uma habilidade precoce em alguma área – um prodígio no piano, por exemplo – e logo assumimos que ela já nasceu pra ser um gênio.

O que acontece é que todos nós nascemos com um potencial um pouco diferente em cada segmento. As crianças que logo de início começam a praticar algo em que coincidentemente têm um potencial maior, se destacam. Entretanto, estamos falando de uma predisposição apenas inicialmente superior, que pode ser suplantada pelo treinamento de outras pessoas menos afortunadas nesse sentido.

Em suma, predisposição genética é importante, mas não determinante. E treinar muito é fundamental, só que treinar muito da forma certa é o que realmente faz a diferença.